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quarta-feira, dezembro 19, 2007

VERTIGEM - Odemar Leotti

Ponho-me a entender que o momento frágil de nossa identidade faz com que nos sintamos em uma vertigem. De tão rápido às vezes nos proporciona uma sensação de fascinação e terror. Esse momento é algo que vive a espreitar nossas vidas, tal e qual quando nos sentimos envoltos no vulto ameaçador de alguém desconhecido que numa situação noturna e apavorante ronda nossa morada, pondo em incerteza, terror e alucinação as possibilidades que formatavam até aí nosso firmamento. Algo assim que costumamos entender como pertencimento, que faz nos identificar como um ente desse mundo. Mas inesperadamente, toda nossa estrutura parece desabar sobre nossos sentidos. Por mais ínfimo que este espaço a nós seja reduzido, ainda assim, lutamos por uma pequena fenda que nos salve. Esse corpo ameaçador é para nós apenas uma silhueta, e isto nos apavora. Idêntico a um ser que nos quer engolir a alma: é isto que traduzimos pela silhueta. Mas se não ouvirmos sua confissão, ou melhor, sem a posse de suas palavras não o discernirmos como uma não ameaça, nos pomos a capturá-lo para afirmação da pulsão da alma, da sua afirmação. É assim que construímos para nós, ou melhor: nos - é construído o que chamam de nossa morada. Então, conhecem de onde nasceram essas poucas palavras, ou essa confissão? Foi de uma epígrafe de Foucault que é assim: Qual é então esse momento tão frágil do qual não podemos separar nossa identidade e que a levará com ele? Viver é aceitar o preço de viver sob um fio de navalha, é viver entre a razão e a loucura, entre a vida e a morte, entre o sorriso e a lágrima, entre a suavidade e o susto.” É nesse espaço prenhe de fragilidade, escorregadio que tentamos segundo a segundo reinstituir o corpo para tentarmos colocá-lo de pé. Esse animal indigente que precisa inventar a vida, para não ser engolido pelo vazio. Fugir da vertigem do vazio: eis o motor da vida, eis o nosso cajado. Peguemos e carreguemos, ele é o nosso fardo. Somos esse animal imperfeito e vertiginoso à procura de um sorriso em meio à tempestade.

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