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sábado, dezembro 01, 2007

A trama e o drama - por Odemar Leotti

Eis a nossa herança. Pisamos barro pra amassar o nosso pão. E o desejo de viver nunca pode nem existir. Ele já nasce aprendido que é dever de todos servir a nação. Já nasce massacrado nosso desejo de viver. De acontecer. As nossas criançadas são assassinadas num montão de lugares. Na barriga da mãe, nas maternidades de pobre que é o barracão. Na escola de pobre que ensina a escravidão. Na porta da escola que faz dela mula da perdição. No emprego que não dão e quando dão é a preço de escravidão. É meu irmão. É isso ai meu irmão. Nós já nascemos nesse drama por não participar da trama. Essa trama que nas mãos dos que tem a grana transforma o sonho de nossas crianças em drama. Quando fica grande só é homem se for escravo ou tiver muita grana. Não me engana com sua trama. Vamos lá irmãos fazer nossa trama porque a dos grandes não me engana. Vamos lá meus manos virar guerreiros de fé. Não tem lugar pra nós na trama que nos engana que vira somente drama. Vê se não se engana mano, veja lá você. Chega de sofrer, chega de esperar a conversa do político. Agora o político tem que ser você, tem que ser a mãe que consola o filho de barriga vazia que não consegue dormir de tanta fome. Somos o público da política. O público tem que mandar na política. Para isso tem que construir sua escrita. Fazer política é direito do público. Não vou viver da trama de quem não me ama.
Todo mundo viu o menino quando ele já estava lá. Roubando uma quirera. Ninguém quis ver quando chorava no berço como criança que não mama. Sua mamadeira estava na conta bancária do bacana, do ladrão considerado e abraçado que vive nos enfiando sua trama. Quando morria de fome no morro ninguém ligava, ninguém reclamava segurança pra ele poder viver. Agora que ele desceu o morro atrás de grama, da marca de tênis mostrada na televisão ou no pé do playboy ou de quem se vendeu pra droga. Ah! Todo mundo reclama. Mas quando chega à loja não tem grana e ninguém nem lhe atende, e só chama a cana. Chama o segurança e fala: espalha menino! Cai fora! Se não chamo a polícia! É isso o que acontece. Ninguém vai tecer seu viver se não participar da trama. O tecido é nossa cama se vier de nossa trama. Na trama do bacana nada fica de sério, só tece buraco no cemitério. Tem muita lama. Segunda feira está chegando e é aí o nosso dia. Dia de fazer esse país enriquecer e esquecer que nós fazemos parte do trabalho e não da ceia. Que coisa feia. Mas que adianta. Ninguém se levanta! Com essa trama que ensina a escravidão, faz da escola fábrica de otário do bacana. Nas igrejas, nas cantigas de ninar. Desde pequeno a criança aprende o refrão da escravidão. Servidão, obrigação, honestidade sem ter direito à dignidade. Ensina ele a servir, a ter dever, mas nunca ninguém divide com ele o prazer. Prazer que nunca tem e nunca terá. Prazer de Angra, de Cabo Frio, de Ipanema, da Barra da Tijuca e nunca ninguém convida ele pra curtir fim de semana em Búzios. Que malvadeza, que nada, nós é que damos moleza. Aperta o cerco. Façamos a guerra, façamos nossa trama. Aí mano. Ninguém nos engana, pois a frase não mais será uma sentença, como a lorota da escola. Antes de aprender a vírgula aprendi o verbo servir. Agora o verbo vai se chamar libertação: da enganação, da enrolação de uma trama de bacana que nos escraviza e nos joga na lama. Por isso mano. Na nossa trama você se chama, pois vai ter nome, não de bacana, mas de quem te ama. Com nome ocupa um lugar nesse espaço roubado de nosso viver por uma trama de gente que não gosta da gente e nos enrola em sua trama. Vamos nos mancar, vamos nos aclamar. Queremos ter nossa trama e não a trama dos bacanas. Chega professor de fazer de conta que não vê a coisa indo para a lama. Esquece essa gramática que não cabe nossa língua. Ela só faz a criança entrar no cano da escravidão do pensamento usado pelo bacana. Vamos irmão construir a trama! Vamos ligeiro antes de nós todos morrermos nesse drama. A vida é boa, mas tem que ser pra todo mundo viver. Na nossa trama ninguém se engana. Chega de drama.
Foto:www.esgotoevida.org.br/images/img_menino.jpg