.

domingo, abril 23, 2006

EM NOME DO PAI

O meu pai me ensinou que eu deveria cuidar do futuro. Quando eu voltava alegre do campinho de futebol, feliz por ter vencido e jogado bem, tudo isto logo tinha fim com a bronca dos meus pais. Dizia que essas coisas não dão camisa pra ninguém. Botaram-me logo cedo pra trabalhar. Vendi de tudo. Banana, laranja, abacaxi, verduras, produtos de limpeza, etc. Me colocou pra estudar na primeira escola da rua. Foi a única que encontrou. Passei boa parte da vida ali. Naquele santuário me ensinaram que eu era pobre, mas era feliz. Ensinaram-me também que havia um menino muito rico que era paraplégico. Fiquei feliz de ser pobre e poder andar. Olha o que eu não entendia era porque pra andar precisava ser pobre. Mas morria de medo de ficar rico e não poder mais andar. Não conseguia entender isso. Mas por segurança falei pro meu pai não ficar rico nunca, pois tinha medo de andar de cadeira de rodas. Nessa escola ensinam cada coisa, né? Hoje parece até bom né? Ta tão difícil de ficar rico que até é bom ensinar as crianças que é perigoso ficar rico. Pois é, estudei naquela escola que me ensinou essas coisas. Naquelas paredes feias e cheias de professores feios que viviam brigando com a gente. Aquela escola de paredes tristes que serviam de molduras, pra cara raivosa do professor senil. Com o tempo minha emoção foi indo embora, na mão daquele imbecil, daquele vil. Foi isso o que vi. Hoje eu quero desaprender essa razão que me fez me desfazer da emoção. Vitrificaram sim minha vontade de ser. Espatifaram meu coração. Tomaram meu lápis de cor e me deram um lápis preto. Impregnaram-me de um outro ser. Tiraram-me de mim ao me formarem em uma busca da perfeição, da emancipação. Era uma busca infinita de uma verdade impossível. Anos após anos nessa milonga sem fim. A areia foi escorregando e a ampulheta virando. A cada dia a vida acabava e o discurso a vivificava de esperança de futuro. O presente de nada valia. Era nisso que a vida resumia. Era feito uma busca intensa à procura da verdade. Porém meu amigo, O tempo foi passando e a redenção esperada cada dia mais longe. Cada dia mais longe.
Odemar Leotti: oleotti@bol.com.br
Fonte da Foto:www.abyssofmutilation.blogs.sapo.pt/arquivo/LALA.jpg

2 Comentários:

  • Paredes sujas servindo de moldura perfeita, adequadamente perfeita para professores senis. Rompo com tanta tristeza, em nome do pai e da mãe também. Não quero esta moldura, não quero vida em preto e branco, não quero aprender, menos ainda ensinar a empalidecer paisagens, emudecer vozes, tapar ouvidos e solapar desejos. Vivo...

    Por Anonymous Anônimo, às 7:06 AM  

  • adorei rachel valeu

    Por Anonymous Anônimo, às 12:24 PM  

Postar um comentário

<< Home